domingo, 25 de julho de 2010

Véspera

Foram todos embora. O silêncio ocupa por completo o espaço e restam sómente as memórias do dia como despojos aprazíveis, quase palpáveis.

Partirei amanhã para o Alentejo com o coração um pouco mais preenchido.

sábado, 24 de julho de 2010

Momento de tranquilidade

É tarde. Uma beatitude inesperada invadiu a sala.

Por certo adivinhou que irá ficar sem mim uns dias.

Ao longe ouve - se uma música popular que chega até aqui já cansada e sem muita força.

É assim! Por esta altura do ano , por esse Portugal fora , festas e romarias : música e dança , conversa à solta.

Festeja-se a vida , aproveita-se o momento .

Põem -se para trás das costas ou dentro de um copo , mesmo que apenas por instantes , os problemas do dia a dia , a crise , os desencontros da vida , as tristezas , a trampa do Sócrates ...

Dançai e bebei , que a vida são dois dias...

quinta-feira, 22 de julho de 2010

A amizade

Um código secreto regula as relações de amizade. As regras não estão escritas em lado nenhum e muitas das vezes também não são verbalmente enunciadas.Se esta informalidade "contratual" fornece à amizade o que de tão especial se lhe reconhece 'obriga' as partes ao uso de tacto , bom senso e , sobretudo , de franqueza e honestidade.



Entendo que a amizade deverá ser uma relação onde a verdade/sinceridade impere , onde possamos ser ao pé do outro quase como somos ao pé de nós próprios.


Por isso carrego na consciência o peso de uma desnecessária embora que inofensiva e inconsequente mentira dita ao meu amigo J.



É preciso que o outro saiba o que pode esperar de nós: não precisaremos de relatar todos os nossos actos ou pensamentos mas é necessária uma base de confiança , é necessário que o outro saiba o que nós , estruralmente , somos. Nada é pior que a insegurança, o não saber com o que se pode contar.


Pudor e acanhamento são sentimentos que não podem ter lugar numa relação de amizade. A amizade é o reino da franqueza.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Memória

Olhou na água o seu rosto reflectido , tremulando entre as pequenas ondas . Parecia uma criança esquecida e abandonada , ansiosa e já um pouco assustada .


Como antigamente , em menino, estava receososo , sentia-se só , profundamente só , como se fosse a unica pessoa à face da terra , como se toda a gente se tivesse ido embora , como se todos o tivessem abandonado. Sentira de novo que o seu pai , do outro mundo , o abandonara uma vez mais.

Ali permaneceu por um bocado absorto nos seus pensamentos , refugiando - se num mundo que só existia dentro da sua cabeça , continuando a olhar a sua imagem reflectida no espelho de água , vendo o seu rosto distorcido , ondulando lentamente em cima daquele tapete liquido . Sentiu-se realmente só . Quase sentiu medo e esteve mesmo quase a chorar , paralizado , até que uma voz vinda de trás de si o trouxe de novo para a realidade.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Crianças

É dia ainda. Parece que ontem não existiu e cheguei a hoje vindo do nada.

Estou entre crianças numa brincadeira que só elas sabem ter , correndo e gritando sem razões aparentes apenas pelo prazer de correr e gritar.Balões coloridos levantam-se no ar e a pequenada delira numa alegria sem fim.Atiramos , uns aos outros, água do pequeno lago junto das árvores e eu vou correndo com eles à minha volta até que as forças se esgotam e me deito na relva , olhando o céu e ouvindo as gargalhadas desordenadas que se espalham pelo espaço. As correrias continuam como se aos meus amiguinhos não acabassem nunca as forças. João atira-se para cima de mim e fica a rir-se olhando-me o rosto suado com um ar interrogativo:"então,não brincas mais?" . "Sim", respondo-lhe com o que resta do meu fôlego e sorrio ao mesmo tempo que lhe faço umas cócegas tentando afastá - lo porque quero descansar um pouco mais ,ali deitado no chão.Não resulta. Assim que se recompõe volta a «atacar-me» , chegando agora a sua vez de me fazer umas cócegas que há muito já não tenho mas disfarço e desfaço - me em trejeitos e risos que a certa altura chegam mesmo a ser verdadeiros .



Corro atrás dele como um monstro assustador aproveitando para amedontrar outros coleguinhas que apanho pelo caminho. Gritos e mais gritos. Correria desenfreada e aleatória por entre as árvores e os arbustos passando por cima de toda a folha , até que me atiro de novo para o chão fazendo - me de morto e quase morto estou tal o cansaço." o monstro morreu" , grito bem alto. Ninguém quis saber de tal acontecimento. Se o monstro morreu outras personagens logo surgiram e a brincadeira continuou caótica e livre.